segunda-feira, 15 de março de 2010

RENOVAÇÃO DIDATICA DO ENSINO MÉDIO











MARQUEZ, Angel Diego. Renovação Didática do Ensino Médio. Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, Rio de Janeiro 44(100): 273-94 out./dez. 1965, separata.


Enquanto um mundo de evolução vertiginosa determina rápidas transformações nos diversos setores da atividade humana, econômico, social, sanitário, etc. A educação parece, inexplicavelmente, situar-se a margem dessas mudanças. Evidentemente, este é um fato paradoxal, mas passível de explicação. As causas dessa indiferença, dessa estagnação, dessa inércia frente ao dinamismo de outros setores, são múltiplas. Sem entrar em sua analise pormenorizada, podemos registrar que tais causas e fatores podem classificar-se em dois principais grupos: fatores endógenos e fatores exógenos, ou seja, intra-escolares e extra-escolares.
Deixando de lado os fatores extra-escolares, políticos, econômicos, sociais etc. Objetivemos, em breves traços, alguns dos fatores intra-escolares.
Acreditamos que a compreensão destes fatores é o primeiro passo necessário para sua transformação. Sustentamos, também, que a reforma do ensino médio poderá vir a ser espontânea, caso não seja facilitada nem favorecida por medidas externas. Isto é, em que pese ao regime legal ou administrativo vigente, à organização e administração do sistema e da escola, a planos e programas arcaicos ou formas de avaliação inadequadas, uma reforma pode processar-se, se os professores estiverem alertados nesse sentido.
Pelo contrario, tal reforma não se concretizara, mesmo existindo todas as condições objetivas favoráveis, se os professores não estiverem imbuídos nesse espírito.
Um dos fatores intra-escolares de maior gravidade será, sem duvida, a falta de uma clara consciência, por parte dos professores, ao papel da escola secundaria na sociedade contemporânea, de seus fins e de seus objetivos. A escola secundaria foi, até poucos anos, um curso a que acendia uma elite destinada a atingir estudos superiores (universitários) para lograr, finalmente, um titulo que lhe iria habilitar ao exercício das profissões liberais.
Enquanto isso, o ensino médio democratizou-se profundamente, abrigando alunos provenientes das mais diferentes camadas sociais, que, embora conservando uma formação acadêmica, trouxeram uma bagagem cultural muito heterogênea e diferente a que possuía a “elite” de outrora. Por outro lado, o ensino médio já não tem por objetivo preparar o aluno para o ciclo superior, não é mais um ciclo sem finalidade em si mesmo, mas um ciclo com objetivos definidos e próprios.
Como observou um educador francês, este ciclo deve estar capacitado a dar ao homem de hoje uma cultura básica, o arsenal de ideias e meios que lhe permita compreender o universo material e humano em que vive integrar-se nele e atuar sobre ele, de acordo com a escala social a que pertence, coerente com o ideal de vida que elegeu. Seu objetivo já não é preparar o homem para a universidade, mas para a vida, e especialmente, para a vida moderna, identificado com o meio geográfico e o contexto social e econômico que deva expandir-se.
O papel do ensino secundário consiste, pois, em elevar a humanidade como define uma circular da Diretoria do ensino secundário na França, ou seja, desenvolver a capacidade de cada um para que se torne um espírito esclarecido, capaz de desprender-se, de ultrapassar as limitações de sua profissão, de seu partido ou de sua religião, para julgar livremente seu tempo e julgá-lo não só a luz do passado, como das exigências do futuro.
Não é de estranhar que a maior parte dos educadores, entregues às tarefas cotidianas, apegados a rotina, perca a perspectiva dessas finalidades.
A renovação didática da escola secundária depende da consecução desses objetivos. A escola não renova seus métodos ou suas técnicas, senão visando alcançar novos fins.
Em síntese, o primeiro fator intra-escolar responsável pela inércia e, consequentemente, pela desatualização da escola média, consiste na ausência de uma tomada de consciência, por parte da maioria dos educadores, de suas novas funções, como também das novas finalidades e objetivos do ensino médio. De tal falta de compreensão decorrem atitudes consequentes, dentre as quais destacamos o habito do enciclopedismo, uma valorização exagerada do intelecto (e em especial da memória) e um menosprezo pelos trabalhos manuais.
Outro fator não menos importante constitui o generalizado desconhecimento da natureza do processo ensino-aprendizagem. Desse desconhecimento resultam múltiplas consequências didáticas: formas inadequadas de motivação, de planejamento da aprendizagem, de avaliação. A atividade docente se reduz, assim, ditado dos pontos, ao estudo dos textos e a verificação do que o aluno memorizou, ouviu ou leu.
Um terceiro fator é a insuficiente formação psicológica e psicopedagógica dos educadores. Esta formação deficiente, ou simplesmente desinteresse psicopedagógico, ocasiona relações imperfeitas entre educando - educador. O educando torna-se desatento, quando não incompreendido, seu rendimento não corresponde as suas possibilidades e, sem orientação, compreensão, apoio, passa a enfrentar sozinho seus problemas.
Somente a modificação profunda desses fatores pode possibilitar a reforma didática do ensino médio.
Toda didática deve ser um sistema coerente, estruturado, harmônico em seus meios. Insistimos em que esses meios tendem a ser fins e se justificam em si mesmos. O valor de um sistema didático não reside nos recursos utilizados, mas, fundamentalmente, na legitimidade dos fins que esses recursos pretendem alcançar.
Como assinala Brunold, o ensino médio deve objetivar uma moderna forma de humanismo. Nele se devem expressar, ao mesmo tempo, esses dois valores que são a “ânsia do conhecimento” e a “ânsia de descoberta”, ou seja, o desejo de conquistar que é por sua vez, a aceitação do desconhecido, anseio de aventura e compromisso indissolúvel com a história. É o ideal pedagógico que deve animar-nos, quando os próprios alicerces de nossos conhecimentos, de nossa organização social e dos valores mais altos parecem abalar-se diante dos descobrimentos em todos os campos e dos acontecimentos de nosso tempo, no momento em que sentimos, mais que em qualquer outro, a aceleração do curso da história.
Ainda que a escola média seja um ideal utópico na América Latina, deve ser um ciclo aberto a todos. Como afirma o plano de Langevin-Wallon: “o ensino de cultura comum, um mínimo para a grande maioria, senão para a totalidade dos jovens”. Será esta uma aspiração absurda? Acreditamos que não. Talvez não seja um ideal muito distante como supõem alguns, que deve ser favorecido por uma autentica justiça social a que a América Latina aspira e a que convém satisfazer prontamente, ante a ameaça de abalos profundos em suas estruturas e em seus valores tradicionais.
Estamos convictos de que a reforma do ensino médio, especialmente em seus aspectos didáticos, devem processar-se em sua base, desde a escola em si mesma e, mais particularmente ainda, deve processar-se no espírito dos educadores. A nova escola media não poderá, não deverá, ser um mero conjunto de medidas de novos recursos didáticos postos em prática, mas um novo espírito do qual em - principio devem estar imbuídos os educadores.
A afirmação precedente não implica em negar o valor das medidas de administração e organização que possam favorecer a reforma didática do ensino médio.
Ressaltar as finalidades gerais para as quais deve estar atenta a nova escola média, esbocemos alguns aspectos da problemática que enfrenta este ciclo e que, fora de duvida, deve ser encarada como um passo estar imbuídos os educadores.

ALGUMAS IDÉIAS SOBRE A DIDÁTICA FUNDAMENTAL
É importante situar a didática no contexto histórico e como ela tem sido utilizada pelos educadores ao longo dos tempos. Para realizar este percurso nos apoiamos em algumas idéias formuladas por Veiga (1991). Na época colonial, os Jesuítas foram os principais educadores no Brasil e atuaram no período de 1549 a 1930. A ação pedagógica dos jesuítas foi marcada pelas formas dogmáticas de pensamento, privilegiavam o exercício da memória e o desenvolvimento
do raciocínio; dedicavam atenção ao preparo dos padres-mestres, dando ênfase à formação do
caráter e sua formação psicológica para conhecimento de si mesmo e do aluno. O ideal de
educação era a formação do homem universal, humanista e cristão. A educação se preocupava com o ensino humanista de cultura geral, enciclopédico e alheio à realidade dos costumes da colônia.Com estas características que o ensino dos Jesuítas apresentava não se podia pensar em
uma prática pedagógica nem mesmo em uma didática que buscasse uma educação voltada para ideais transformadoras, o enfoque da didática estava centrada no seu aspecto formal, tendo como
referência o intelecto, o conhecimento e marcado pela visão essencialista de homem.

Nesse período a compreensão do ensino da didática é vista como um conjunto de regras e normas prescritivas visando a orientação do ensino e do estudo.
O período de 1930 a 1945 o caráter da didática é tradicional e o movimento é pela sua mudança. É marcado pela influência de duas vertentes: a da concepção humanista representada pelos católicos e a humanista moderna representada pelos pioneiros. A concepção humanista moderna se baseia em uma "visão de homem centrada na existência, na vida, na atividade". O movimento da escola nova propõe um novo tipo de homem, defende os princípios democráticos é centrado na criança. A ênfase recai no ensinar bem, mesmo que a uma minoria, a criança é vista como ser dotada de poderes individuais, cuja liberdade, iniciativa, autonomia devem ser respeitados. O professor absorveu o ideário da escola nova e nesse momento a didática sofre a sua influência, passando a acentuar o caráter prático-técnico do processo do ensino e aprendizagem. De acordo com Candau(1982, p. 22), "os métodos e técnicas mais difundidos são: centros de interesse, estudo dirigido, unidades didáticas etc. "Com estes pressupostos a didática possibilitou a formação de um novo perfil do professor: o técnico.
Os anos de 1945 a 1960 ocorre a disposição de novas idéias para a didática. Neste período ocorre no ensino, a inspiração da corrente do liberalismo e do pragmatismo, fato que prevalece na educação a acentuação dos processos metodológicos técnicos em contraposição ao próprio conhecimento. A didática se revelava no seu caráter acentuadamente prático sem considerar o
contexto político-social. No bojo da escola nova se acentuava então, o enfoque renovador tecnicista da didática.
O movimento que se instalou no país após 1964 modificou a ideologia política, a forma de governo do país e conseqüentemente a educação. Segundo Veiga (1991, p.35), " o enfoque do papel da didática a partir dos pressupostos da pedagogia tecnicista procura desenvolver uma alternativa não psicológica, situando-se no âmbito da tecnologia educacional, tendo como preocupação básica a eficácia e a eficiência do processo de ensino. Essa didática tem como pano de fundo uma perspectiva realmente ingênua de neutralidade científica'". Com o pressuposto abordado por Candau, verifica-se que começa a dar sentido o planejamento didático formal, a organização racional do processo de ensino. Nas palavras de Candau, "o processo é que define o que os professores e alunos devem fazer, quando e como farão".
Esta é uma concepção e atuação técnica da didática que tem como função principal
organizar, dar formas e meios de processar o ensino. Nesse sentido, o professor passa a ser mero
instrutor do ensino, direcionando e executando as estratégias do processo de ensino. A década de 1980 produz movimento de renovação da didática. Os críticos passam a apontar o conteúdo ideológico, buscando a fundamentação da didática em oposição ao seu caráter meramente instrumental.
Com este pressuposto buscava-se a formação de professores pautada com os conhecimentos sociológicos, filosóficos e histórico, cuja dimensão passa a fazer parte de um movimento que procurava uma nova identidade para a didática.

Esta nova identidade devia ser buscada na sua fundamentação, na sua dimensão sociológica, histórica e filosófica, ou seja, a formação de professores não poderia mais ser pensada sem uma postura que pense, que reflita, que interaja com o sócio-político. Esse é o pressuposto de uma pedagogia crítica, é o de trabalhar além dos conteúdos e técnicas, procurando uma associação entre escola-sociedade, teoria-prática, conteúdo-forma, ensino-pesquisa, professor-aluno.
Historicamente a didática foi considerada como instrumento que deve dar forma e organização aos processos de ensinar e aprender. É a disciplina por excelência que deve tratar dos meios, dos processos e das formas de estruturar o ensino. Essa concepção, não pode ser pensada no processo de formação atual dos professores, sem a perspectiva da sua dimensão política e social. Esta é a principal defesa pontuada por Candau (1991, p.15), que preconiza o estudo da didática dentro da multidimensionalidade do processo educativo. Esta prerrogativa implica o estudo da didática em três dimensões: a humana, a técnica e a política.
A associação dessas três dimenções é que daria o elemento chave para uma didática fundamental, voltada para os objetivos de uma formação integral dos professores, cuja ação estaria fundamentada na técnica, no humano e no político.
De acordo com Candau (1991, p.15) "a competência técnica e o compromisso político se exigem mutuamente e se interpenetram. Não é possível dissociar um do outro. A dimensão técnica da prática pedagógica, objeto próprio da Didática, tem de ser pensada à luz de um projeto
ético e político-social que a oriente".
Com as questões expostas neste artigo, posicionamos nossa concepção de que a formação dos alfabetizadores de Educação de Jovens e Adultos deve ser pautada com o trabalho de contextualização da prática pedagógica, que deve ser uma constante, pois a prática pedagógica, com as características de uma didática fundamental deve refletir a problemática educacional concreta. Nesse sentido, a prática de educação com jovens e adultos é um projeto que se insinua
com vários determinantes que revelam a realidade em múltiplos aspectos: a do adulto trabalhador, às vezes, um longo período de afastamento de atividades escolares, a vida precária, a
baixa auto estima.
O alfabetizador, na nossa avaliação, deve estar munido de fundamentação para poder
estabelecer as relações entre a realidade do educando e as exigências que o seu estudo requer. É
preciso ter a visão de que não basta apenas os conhecimentos de alfabetização ou rudimentos de
matemática e conhecimentos gerais, é necessário antes de tudo ser capaz de interpretar estes conhecimentos à luz de uma didática que oriente a sua formulação. Ou seja, o alfabetizador deve
estar fundamentado dentro de uma visão de mundo, de escola, de cidadão que lhe permita
influenciar e modificar os conceitos que os alfabetizandos irão utilizar na sua vida futura. Não se pode mais pensar em um educador neutro que não esteja imbuído de uma concepção filosófica, política e social que também irá influenciar no decisivo papel que temos, frente a modificações no projeto de vida dos alfabetizandos.
É com esta compreensão que estamos buscando a formação do alfabetizador da Alfabetização Solidária, mesmo que com as limitações do tempo, busca-se o fator da qualidade que se almeja nessa formação.

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